terça-feira, novembro 15, 2005

Títulos de obras - talvez a primeira reflexão artística séria do blog (ou não)

Não há coisa que eu mais odeie que aquelas obras de arte que têm títulos como “Proposição 1”, ou, pior, “Sem Título 134”. Irrita-me. Para mim o título de uma obra pode ser arte, só por si. Apercebi-me disto quando vi um quadro, há alguns anos, no Museu Machado de Castro em Coimbra. Com cores vivas, tipo cartoon, estava um monte de lixo em primeiro plano – meias sujas, garrafas, papel – e no canto uma rosa. Mas a sombra daquele monte de lixo, que se projectava atrás, era o perfil da cidade de Coimbra – não sei se estão a ver, a Cabra e a Universidade lá em cima, aquelas casecas por aí abaixo. Título da obra: “São Rosas, Senhor”. Fantástico. Se tivesse dinheiro e fosse maior de idade tinha comprado aquele quadro logo ali. Se tivesse o mínimo de sentido de futuro tinha apontado a porcaria do nome do autor.
E não poderemos esquecer o “Ceci n’est pas un pipe”, de Magritte, orgulhoso logotipo da PenetrArte, ou mesmo ‘La Fontaine’ de Duchamp.
Resolvi então dar aqui alguns títulos de obras que me despertam o sentido estético da leitura:
De Dalí, esse prolífero inventor de títulos estranhos:
- Todas as Formas Derivam do Quadrado (composição cubista)
- O Mel é mais Doce que o Sangue
- A Vaca Espectral
- A Amálgama – por Vezes Cuspo com Prazer no Retrato de Minha Mãe
- A Nostalgia do Canibal
- Pão Francês Médio com Dois Ovos Estrelados a Cavalo, sem o Prato, Tentando Sodomizar um Bocado de Pão Português
- Devaneio – Recomendação: Estragar Completamente a Ardósia
- Fonte Necrofílica Correndo de Um Piano de Cauda
- Burocrata Médio Atmosferocéfalo a ordenhar uma Harpa Craniana
- O Espectro de Vermeer de Delft Podendo Ser Utilizado como Mesa
- Omeleta Caminhando Irresistivelmente para o Esmagamento pelas Mãos
- O Sonho Coloca a Mão no Ombro de um Homem
- O Farmacêutico de Ampurdán à Procura de Absolutamente Nada
- Destroços de Um Automóvel Dando à Luz um Cavalo Cego que Morde um Telefone
- Telefone Num Prato com Três Sardinhas no Fim de Setembro
- O Perverso Polimorfo de Freud, também conhecido como Criança Búlgara a Comer um Rato
- Dois Bocados de Pão Exprimindo o Sentimento do Amor
- Adereço de Nú com Cauda de Bacalhau
- As Chamas, Chamam
- Sonho Causado pelo Voo de Uma Abelha à Volta de uma Romã, Um Segundo antes do Despertar
- Fonte de Leite a Correr em Vão sobre Três Sapatos
- Nariz de Napoleão Transformado em Mulher Grávida Passeando a Sua Sombra com Melancolia entre Ruínas Originais
- Relógio Mole Explodindo em 888 Pedaços após Vinte Anos de Completa Imobilidade
- Jovem Virgem Auto-Sodomizada pelos Cornos da Sua Própria Castidade
- Dioniso Cuspindo a Imagem Completa de Cadaqués na Ponta da Língua de Uma Mulher com Três Gavetas
- Árabes Ácidodesoxirribonucleicos
- Um Relógio Mole Colocado no Local Adequado que Faz Morrer e Ressuscitar um Jovem Efebo por Excesso de Satisfação
- Cama e Duas Mesas-de-Cabeceira Atacando Ferozmente um Violoncelo
Outros artistas:

- Cruzeiro Seixas, O Quotidiano (uma chávena de chá com florinhas e a asa no interior da chávena)
- Merlin Carpenter, Quando Não está Nada dentro de Ti além de Ti
- Maurizio Cattelan, Ele (fotomontagem de Hitler ajoelhado)

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